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Neuroeconomia: O Impacto dos Processos Cerebrais nas Decisões Econômicas


Você já se perguntou por que tantas pessoas caem em promoções impulsivas ou fazem escolhas financeiras arriscadas mesmo conhecendo as possíveis consequências? A Neuroeconomia, campo que funde Neurociência, Psicologia Cognitivo-Comportamental e Economia, busca explicar a arquitetura neural que influencia a tomada de decisão econômica.

Ao contrário da visão clássica do "homem econômico racional", as pesquisas neuroeconômicas mostram que nossas escolhas financeiras são permeadas por emoções, heurísticas e processos inconscientes, mediados por circuitos cerebrais ancestrais.


1. O cérebro econômico: entre emoções e racionalidade

O cérebro não decide com base apenas em dados lógicos; ele avalia cenários por meio de um equilíbrio instável entre emoção e razão. De acordo com Antonio Damasio (1994), a tomada de decisão é fortemente modulada por marcadores somáticos, que são reações fisiológicas e emocionais vinculadas à memória de experiências passadas.

Quando tomamos uma decisão econômica (como investir ou gastar), duas vias se ativam:

  • A via cognitiva, envolvendo o córtex pré-frontal dorsolateral (análise lógica e cálculo de riscos).

  • A via emocional, mediada pelo sistema límbico (amígdala, núcleo accumbens e ínsula).

Esse circuito explica por que investidores, por exemplo, podem agir de maneira irracional em momentos de euforia do mercado ou pânico financeiro.


2. O dilema da aversão à perda

Curiosidade: Porque a sensação neural de perder R$ 100,00 é mais intensa do que o prazer de ganhar R$ 100,00. Esse desequilíbrio foi mapeado por Tom et al. (2007), que identificaram maior resposta na ínsula e na amígdala durante decisões aversivas à perda. O porque disso? Vamos a explicação:


Do ponto de vista neurobiológico, o estudo de Tom et al. (2007) demonstrou que regiões como a ínsula e a amígdala são mais ativadas quando as pessoas antecipam uma possível perda de dinheiro do que quando antecipam um ganho do mesmo valor.

A ínsula está ligada à percepção de emoções negativas, como nojo e desconforto, e também à antecipação de riscos. Já a amígdala é conhecida por seu papel em respostas de medo e ameaça. Isso explica por que, neurologicamente, a ameaça de uma perda financeira ativa um sistema de alerta mais forte do que a perspectiva de um ganho.

Esse "desequilíbrio" também pode ser visto como uma adaptação evolutiva: nossos ancestrais, em ambientes hostis, precisavam reagir com mais intensidade às ameaças (como perda de recursos ou riscos à sobrevivência) do que aos ganhos potenciais. Esse traço se manteve e hoje se manifesta, por exemplo, em decisões econômicas ou financeiras.


Por sua vez no ponto de vista comportamental e cognitivo, esse desequilíbrio entre perdas e ganhos é refletido no fenômeno conhecido como aversão à perda, descrito na teoria dos prospectos por Kahneman e Tversky. Cognitivamente, as pessoas tendem a atribuir um peso emocional e psicológico maior às perdas do que aos ganhos de valor equivalente. Esse viés faz com que a dor de perder R$ 100,00 seja mais intensa do que o prazer de ganhar a mesma quantia. A tomada de decisão, nesses casos, se torna mais conservadora, priorizando a evitação de prejuízos em vez da busca de lucros. Essa assimetria na avaliação dos resultados gera uma distorção nas escolhas, levando as pessoas a evitarem riscos quando confrontadas com a possibilidade de ganho, mas a aceitarem riscos maiores quando o objetivo é evitar uma perda. Esse padrão também se relaciona ao chamado viés da negatividade, no qual eventos negativos são processados com mais profundidade, maior atenção e tendem a ter um impacto emocional e comportamental mais duradouro do que eventos positivos. Assim, do ponto de vista cognitivo, a mente humana prioriza a autoproteção e a minimização de ameaças, o que contribui para comportamentos de cautela e esquiva em situações de incerteza. Essa tendência, embora nem sempre racional, pode ser compreendida como uma heurística de decisão que ajudou na adaptação e sobrevivência ao longo da evolução humana.


3. Neuroeconomia e TCC: uma ponte clínica

O campo da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) também dialoga com a Neuroeconomia, especialmente em intervenções voltadas para indivíduos que apresentam padrões disfuncionais de tomada de decisão, como:

  • Jogadores patológicos (aposta compulsiva).

  • Consumidores compulsivos.

  • Investidores impulsivos.

A TCC atua na modificação de distorções cognitivas, como o otimismo irreal (“eu sempre ganho no final”) e o viés de confirmação (“ignoro os dados que vão contra minha crença financeira”), que são sustentados por circuitos de recompensa cerebral hiperativados (núcleo accumbens) e déficits de regulação no córtex pré-frontal ventromedial.

Além disso, a modelagem comportamental e o treinamento em regulação emocional, elementos-chave da TCC, ajudam a reduzir a ativação exagerada do sistema límbico diante de decisões econômicas de alto risco.


4. O sistema de recompensa: por que o "desconto relâmpago" nos pega?

O núcleo accumbens é central na neuroeconomia por sua atuação no processamento da recompensa antecipada. Estudos mostram que promoções limitadas e estímulos de urgência ("compre agora") aumentam a ativação dessa região, liberando dopamina e gerando uma sensação de prazer imediato.


Curiosidade: O mesmo circuito dopaminérgico ativado pela expectativa de ganho financeiro é acionado em experiências como uso de drogas psicoativas e jogos de azar (Knutson et al., 2001).

5. Economia comportamental e heurísticas neurais

A Neuroeconomia também dialoga com as heurísticas (atalhos mentais) estudadas pela Economia Comportamental:

  • Efeito Ancoragem: quando nossa decisão é influenciada por um valor inicial arbitrário. Ex.: preço "de" R$ 500,00 "por" R$ 250,00.

  • Efeito Framing: escolhas são distorcidas conforme o modo como as opções são apresentadas (ganho vs. perda).

Neurocientificamente, essas distorções estão ligadas à interação entre córtex orbitofrontal (avaliação do contexto) e sistema límbico (impacto emocional).


6. Aplicações éticas e comerciais

Empresas e plataformas digitais têm utilizado a Neuroeconomia para otimizar:

  • Campanhas de marketing baseadas em gatilhos emocionais.

  • Arquitetura de escolha que facilita compras impulsivas (ex.: frete grátis em compras acima de certo valor).

  • Modelos de precificação dinâmica que ativam o sistema de recompensa em consumidores.

Por outro lado, surgem debates éticos relevantes sobre neuromanipulação e vulnerabilidade do consumidor diante de estratégias que exploram a neurobiologia da decisão.



A Neuroeconomia revela que nossas decisões econômicas são resultado de uma complexa dança entre razão, emoção e memória afetiva. Entender como áreas como o córtex pré-frontal, o núcleo accumbens e a ínsula interagem em decisões cotidianas, como um simples gasto com lazer ou um investimento de alto risco, permite refletir sobre o quanto nossos comportamentos financeiros são programados por processos cerebrais automáticos.

Ao integrar estratégias cognitivas da TCC com o conhecimento neuroeconômico, podemos desenvolver habilidades de tomada de decisão mais conscientes e equilibradas, protegendo-nos das armadilhas do consumo emocional e das dinâmicas do mercado.


Indo aos Graficos

1️⃣ Ativação do Núcleo Accumbens em compras impulsivas – mostra como "descontos relâmpagos" aumentam significativamente a ativação do sistema de recompensa no cérebro.

2️⃣ Comparação entre aversão à perda (ínsula) e expectativa de ganho (núcleo accumbens) – evidencia como o cérebro responde de forma mais intensa ao risco de perda do que à antecipação de um ganho.








🧠 Curiosidades clínicas e exemplos TCC + Neuroeconomia

🔍 1. Caso clínico real: tratamento de jogadores compulsivosEstudos (Hodgins et al., 2011) mostraram que pacientes com transtorno do jogo patológico apresentam hiperatividade no núcleo accumbens e déficit de controle inibitório no córtex pré-frontal dorsolateral.➡️ Intervenções de TCC focadas em reestruturação de crenças disfuncionais (“eu estou no controle da sorte”) e técnicas de atraso de gratificação ajudaram a normalizar padrões de escolha financeira e a reduzir a impulsividade.

🔍 2. O “paradoxo do investidor emocional”Um estudo de Kuhnen & Knutson (2005) mostrou que investidores sob forte ativação da ínsula ao ver gráficos de perdas recentes tendem a abandonar investimentos promissores por medo de perda, mesmo quando dados objetivos indicam alta chance de ganho futuro.➡️ O uso de exposição gradual a riscos controlados e técnicas de mindfulness pela TCC tem sido utilizado para treinar a regulação emocional em tomada de decisão financeira.

🔍 3. Neurofeedback aplicado ao autocontrole financeiroPesquisas recentes têm explorado o uso de neurofeedback como complemento à TCC, com o objetivo de ensinar pacientes a reduzir a hiperatividade do sistema límbico (especialmente o núcleo accumbens) ao serem expostos a estímulos de consumo emocional (ex.: propagandas de “ofertas relâmpago”).


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